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segunda-feira, 21 de julho de 2014

Alterações à Lei nº 102/2009, de 10 de setembro



Autoria:
Paulo Moreira
Jurista / Sócio co-fundador da Factor Segurança

Este artigo foi publicado nas seguintes revistas técnicas:
TECNOMETAL - n.º 211 março/abril 2014
KÉRAMICA - n.º 327 março/abril 2014
 

A Lei nº 102/2009, de 10 de Setembro, que regula o regime jurídico da promoção da segurança e saúde no trabalho nas empresas, foi recentemente alterada pela Lei n.º 3/2014, de 28 de Janeiro.

O principal motivo para a alteração à Lei nº 102/2009 foi a obrigação imposta ao Estado português de adaptação do regime de prestação de serviços externos de Segurança e Saúde no Trabalho (doravante designada SST) à Diretiva Serviços - Diretiva n.º 2006/123/CEque tem como objetivos:

  A simplificação administrativa nos processos envolvidos na criação e realização de uma atividade de serviços;

  A eliminação de obstáculos jurídicos e administrativos ao desenvolvimento das atividades de serviços;
  A liberalização da prestação temporária de serviços transfronteiriços.
Trata-se, assim, de uma alteração por motivos de natureza económica com grandes repercussões ao nível do funcionamento do setor de atividade das empresas de prestação de serviços externos de SST, com redução de exigências para o exercício da atividade bem como a liberalização de prestação desses serviços, em Portugal, por empresas sediadas noutros Estados Membros, sem necessidade de autorização, comunicação ou informação do facto à ACT. (artº 84 nºs 8 a 10, artº 85 nº 5).
Porém, o legislador, aproveitando o momento, procedeu a outras alterações que podem afetar o dia-a-dia da generalidade das empresas em termos de cumprimento das obrigações de Segurança e Saúde no Trabalho. É sobre essas alterações que versa este artigo e que passamos a apresentar:
i) Alteração do conceito de “Trabalhador” (artº 4º al. a))
Passa a considerar-se trabalhador qualquer pessoa singular que esteja na dependência económica do empregador em razão dos meios de trabalho e do resultado da sua atividade, ainda que não titular de uma relação jurídica de emprego. A relevância desta alteração é grande pois abrange-se neste novo conceito os profissionais liberais ou empresários em nome individual quando estejam na dependência económica do empregador, isto é, quando a totalidade ou grande parte dos seus rendimentos (presumivelmente > 80%) seja obtida do trabalho prestado a uma empresa.
ii) A Segurança e Saúde no Trabalho como um Sistema. (artº 15º nº2 al. b))
Passa a ser obrigação do empregador “planificar a prevenção como um sistema coerente que integre a evolução técnica, a organização do trabalho, as condições de trabalho, as relações sociais e a influência dos fatores ambientais”. Por oposição a uma visão mais técnica de medidas avulsas apenas destinadas a eliminar ou reduzir o risco.  
iii) Redução da periodicidade de consulta aos trabalhadores (artº 18º nº1)
Reduz-se de 2 vezes para 1 vez por ano a obrigação de efetuar consulta aos trabalhadores sobre a avaliação dos riscos para a segurança e a saúde no trabalho, as medidas de segurança e saúde para redução do risco ou outros aspetos relacionados com a SST.
iv) Comunicação à ACT / DGS da exposição dos menores a agentes perigosos (artº 68º nº 2)
O empregador que tenha menores ao seu serviço sujeitos a exposição a agentes físicos, biológicos e químicos, para além da avaliação da exposição dos menores a esses agentes, fica agora obrigado a comunicar à ACT (Autoridade para as Condições de Trabalho) e/ou DGS (Direção Geral de Saúde) o resultado da avaliação daquela exposição

v) Corresponsabilidade contraordenacional dos serviços externos (artº 73-B, nº 7 al. a)
As empresas que prestem serviços externos de SST passam a ser corresponsáveis com o Empregador pelo pagamento de coimas por violação do dever de implementar as atividades principais de SST.
Até agora apenas os Empregadores tinham essa responsabilidade, mesmo que as principais atividades da SST não tivessem sido implementadas por culpa exclusiva das empresas que prestam os serviços externos de SST. Pode ser que esta medida contribua para moralizar um pouco as relações entre algumas empresas de serviços externos de SST e as empresas que as contratam.
vi) Redução das comunicações à ACT e DGS.
a) Desnecessidade de comunicação à ACT da modalidade de serviços SST adotados mesmo nos casos em que contrata empresa de serviços externos estrangeira. Antes tal obrigação concretizava-se através do envio do modelo 1360. (artº 74 nº 7)
b) Desnecessidade de comunicação à ACT de situação particularmente grave ao nível dos acidentes Para clarificação do conceito de “situação particularmente grave” fora emitida, há cerca de 10 anos, uma nota informativa da IGT contendo duas listagens, uma em que havia lesão, outra em que não havia lesão mas em que o próprio evento assumia uma particular gravidade na perspetiva da segurança e da saúde no trabalho. Face à nova redação do nº 1 deste artigo, esse segundo grupo de situações deixa de necessitar de comunicação à ACT. (artº 111 nº 1).
vii) Simplificação das comunicações à ACT e DGS.
Simplifica-se a comunicação à ACT e à DGS de situações relacionadas com a SST pela utilização da via eletrónica, junto do balcão único eletrónico dos serviços, como é o caso da comunicação da exposição dos menores a agentes perigosos (artº 96º-A)
viii) Novas atividade de SST (artº 75º)
Acrescenta-se ao elenco das atividades que as empresas devem assegurar, qualquer que seja a modalidade do serviço de SST adotada. Assim, para além das atividade de primeiros socorros, de evacuação de trabalhadores e de combate a incêndios, a empresa passa a ser obrigada a assegurar as atividades de emergência e, sempre que aplicável, de resgate de trabalhadores em situação de sinistro.

ix) Possibilidade dispensa de realização de alguns exames de saúde (artº 108º nº 6 al. a) e b)).
A realização do exame de admissão pode ser dispensada nos seguintes casos:
a) Em que haja transferência da titularidade da relação laboral, desde que o trabalhador se mantenha no mesmo posto de trabalho e não haja alterações substanciais nas componentes materiais de trabalho que possam ter repercussão nociva na saúde do trabalhador;
b) Em que o trabalhador seja contratado, por um período não superior a 45 dias, para um trabalho idêntico, esteja exposto aos mesmos riscos e não seja conhecida qualquer inaptidão desde o último exame médico efetuado nos dois anos anteriores, devendo a ficha clínica desse mesmo exame ser do conhecimento do médico do trabalho.

x) Empresas em que seja o próprio Empregador a assegurar a SST (artº 81º)
Nas empresas que empreguem no máximo nove trabalhadores, com atividade que não seja de risco elevado, em que o Empregador tenha formação adequada e permaneça habitualmente no estabelecimento, as atividades de SST podem ser asseguradas pelo próprio Empregador sem necessidade de contratar fora estes serviços, desde que obtenha autorização da ACT.
a) o pedido de autorização agora é feito através da via eletrónica, junto do balcão único eletrónico dos serviços;
b) deixa de ser necessário pedir a renovação da autorização ao fim de 5 anos;
c) a ACT viu reduzido o prazo para a decisão de autorização de 60 para 45 dias;
d) findo o qual se produz ato tácito de deferimento.
xi) Empresas que sejam obrigadas a organizar serviços internos de SST (artº 80º)
As empresas que não exerçam atividades de risco elevado e que empreguem mais de 400 trabalhadores num só estabelecimento ou no conjunto de estabelecimentos distanciados até 50 km daquele que ocupa maior número de trabalhadores, embora sujeitas à obrigação de organizar serviços internos de SST, podem pedir dispensa desses serviços se reunirem algumas condições.
a) o pedido de dispensa agora é feito através da via eletrónica, junto do balcão único eletrónico dos serviços;
b) a vistoria da ACT passa a facultativa, agilizando-se assim o pedido de dispensa de serviços internos.


xii) Empresas que queiram organizar serviços Comuns de SST (artº 82º)
As empresas que não exerçam atividades de risco elevado ou não empreguem mais de 400 trabalhadores podem organizar as atividades de SST conjuntamente desde que o comuniquem à ACT.
a) simplificou-se o recurso à modalidade de serviços Comuns. Agora as empresas apenas comunicam a modalidade à ACT não necessitando de pedir autorização;
b) a comunicação passa a ser efetuada através da via eletrónica, junto do balcão único eletrónico dos serviços.

Deste modo, das cerca de oitenta (80) alterações que a Lei n.º 3/2014, de 28/01 introduziu na Lei nº 102/2009, de 10/09, resumimos a 12 as principais alterações com impacto no dia-a-dia da generalidade das empresas em termos de cumprimento das obrigações de Segurança e Saúde no Trabalho.


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